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O recado que a Bolívia quis dar ao PCC

14 julho 2017 - 17h07Fábio Marchi

Foi com muita surpresa e horror que eu vi ontem (14) uma das cenas mais surreais já gravadas e distribuídas nas redes sociais: reféns na porta de uma loja de relógios de luxo -localizada no centro da cidade de Santa Cruz, Bolívia - sendo FUZILADOS juntamente com os seus algozes, bandidos brasileiros integrantes da organização criminosa conhecida como Primeiro Comando da Capital - o PCC.

O saldo da ação policial foi impressionante: cinco mortos, sendo um refém (há relatos que dizem que foram dois reféns), três criminosos brasileiros e um policial local, assim como 10 feridos por tiros e dois detidos.

Não há muito o que discutir, as imagens foram claras: a polícia não quis saber de conversa e mandou bala em todo mundo. Não teve negociação, não teve diálogo. A polícia boliviana iniciou um massacre em plena luz do dia, sem se importar com a vida dos reféns. Em uma das cenas - amplamente divulgadas nas redes sociais - um dos bandidos se rende e se joga ao chão, com as mãos para cima, mas é fuzilado pela polícia logo em seguida.

Para um bom entendedor, o recado é claro: a Bolívia não quer que aconteça em seu território a mesma coisa que está acontecendo no Paraguai, onde o PCC já domina um grande território paraguaio - a começar pelas fronteiras de Ponta Porã e Foz do Iguaçu, onde o grupo já controla a venda de drogas, armas e contrabando de cigarros e bebidas na área. Praticamente todos os dias temos notícias sangrentas relacionadas à disputa do poder no submundo do crime nesses locais, e o PCC é protagonista em quase todas elas.

Curiosamente, a polícia dos países Argentina, Paraguai, Bolívia e Uruguai são consideradas as mais corruptas da América Latina, inclusive com relatos de viajantes e turistas que tiveram péssimas experiências em suas passagens por estes países. E essa sensação de corrupção não fica apenas nos relatos dos viajantes e turistas - que são extorquidos com B$ 100 (cem bolivianos, moeda local) por qualquer “infração” (alguns delas inventadas na hora, pela autoridade policial).

Para se ter uma idéia no estudo realizado pela ONG “Organização para Transparência Internacional” a Bolívia ocupa o 113º lugar no ranking. O Brasil, com TODA essa corrupção que o brasileiro conhece muito bem, está em 79º - o que nos leva a crer que a coisa por lá é bem pior do que aqui.

A Bolívia, assim como Paraguai tem seus atrativos para o PCC: são países onde produzem grande quantidade de drogas, a importação de armas é praticamente livre e a moeda corrente é o dólar - o que significa que não é ilegal transitar com grandes quantidades da moeda americana por lá. A bandidagem delira. De igual forma, a Bolívia hoje é a maior produtora mundial de folhas de coca - a planta também é a matéria-prima da cocaína e o alvo mais atacado dos esforços antinarcóticos por toda a América do Sul, comandados em grande parte pelos Estados Unidos - país que manteve e financiou um programa antidrogas na Bolívia de 1997 a 2004 mas acabou tendo seus agentes do DEA expulsos em 2008, após graves conflitos entre os agentes e a população “cocaleira” - os produtores da planta de coca.

Por cultivar uma política que continua produzindo matéria-prima para a produção de cocaína e uma legislação permissiva na questão de receptação de mercadorias roubadas ( as localidades brasileiras fronteiriças sofrem demais com os roubos de veículos que CONTINUAM sendo comprados ilegalmente na Bolívia), a Bolívia acaba se tornando um alvo cobiçado para as facções brasileiras - uma vez que o Brasil está tornando a vida dos traficantes cada vez mais difícil, com um emprego cada vez maior da tecnologia (drones, raios-x de caminhões, grampos tecnológicos) e do avanço da inteligência policial (serviço reservado, cães farejadores, treinamento intensivo), resultando em apreensões cada vez maiores. A legislação brasileira também acabou trazendo muitos prejuízos às facções criminosas - em especial a Lei do Abate - onde muitas quadrilhas perderam aeronaves, aeroportos, fazendas e carregamentos inteiros a partir da interceptação aérea de grandes quantidades de carga de armas, drogas e munições.

Como a coisa aqui no Brasil engrossou, os bandidos brasileiros estão voltando-se para seus antigos parceiros comerciais. É por isso que estamos passando a ver cenas cinematográficas como a do assalto à Brinks no Paraguay e à um carro-forte na Bolívia, há poucos meses atrás. A carne que alimenta o leão está escassa - e o leão volta-se para seu dono.

Vemos aí um grande revés: a Bolívia é um dos países que produzem a matéria-prima para o tráfico - em especial o Brasil - e assim, ajudam a sustentar esses grupos criminosos. Agora esses grupos criminosos, já “fortes e alimentados” estão aos poucos eliminando os intermediários e a tendência será tomar de assalto a produção, em um futuro próximo. Nada pessoal hermanos, és solo negócios. Business, baby!

Enquanto a Bolívia não se tornar um país sério no combate às drogas - eliminando os produtores de cocaína, os contrabandistas de armas e adotando uma legislação mais rígida para que CRIME seja CRIME (como a receptação de mercadorias roubadas - que também alimenta o narcotráfico), a Bolívia será um alvo do PCC e de outras facções criminosas.

O recado de ontem foi duro, sangrento e até mesmo desumano - porque reféns e civis não deveriam pagar com sua vida uma guerra que eles não pediram para participar.

Mas vocês - hermanos bolivianos - precisarão muito mais do que isso, para impedi-los - pois a parada é sinistra.

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