Câmaras Municipais não têm poder para rever decisões dos Tribunais de Contas, decide STF
Supremo reconheceu que cabe às Cortes de Contas o julgamento técnico de gestão dos prefeitos, podendo determinar o ressarcimento ao erário e aplicar sanções administrativas
25 JUN 2025 • POR Vinícius Santos • 11h36O Supremo Tribunal Federal (STF) firmou entendimento de que os Tribunais de Contas possuem competência para julgar as contas de gestão de prefeitos que atuam como ordenadores de despesas e aplicar sanções como multas e imputações de débito, sem necessidade de deliberação das Câmaras Municipais. A decisão foi tomada no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 982/PR, proposta pela Atricon (Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil).
A ação discutia a possibilidade de os Tribunais de Contas exercerem o controle técnico sobre as contas de gestão dos prefeitos – aquelas que envolvem diretamente a movimentação de recursos públicos, como contratos, licitações e execução orçamentária. O STF reconheceu que, nesses casos, o julgamento é de competência exclusiva dos Tribunais de Contas, e as sanções administrativas e financeiras, como a exigência de ressarcimento ao erário e aplicação de multa, podem ser impostas diretamente por esses órgãos, sem interferência do Poder Legislativo local.
A Corte diferenciou esse tipo de análise das contas de governo, que são aquelas que avaliam o conjunto das políticas públicas e a execução orçamentária anual do município. Neste caso, permanece a exigência de julgamento pela Câmara Municipal, com base em parecer técnico do Tribunal de Contas.
Na prática, o STF reafirmou três pontos principais:
- Quando o prefeito atua como ordenador de despesas, ele deve prestar contas diretamente ao Tribunal de Contas.
- O Tribunal de Contas pode julgar essas contas e aplicar sanções em caso de irregularidades, incluindo multa e imputação de débito.
- A Câmara Municipal continua sendo responsável apenas pelo julgamento das contas anuais de governo, que têm repercussão eleitoral, mas não pode revisar ou anular as decisões técnicas dos Tribunais de Contas referentes às contas de gestão.
A Atricon destacou que essa decisão fortalece o papel constitucional dos Tribunais de Contas e evita que o julgamento político-administrativo das Câmaras Municipais interfira em decisões técnicas e especializadas. Segundo a entidade, o julgamento do STF preserva o equilíbrio entre o controle técnico e o controle político, assegurando que a responsabilização administrativa e financeira fique a cargo das Cortes de Contas, enquanto a análise com efeitos eleitorais permaneça sob responsabilidade do Legislativo local.
Efeitos eleitorais e inelegibilidade
O STF também tratou da relação entre a rejeição de contas e a inelegibilidade. A Corte reafirmou que, conforme a Lei Complementar nº 64/1990 (Lei de Inelegibilidades), apenas a rejeição das contas anuais de governo pela Câmara Municipal pode gerar inelegibilidade. Ainda assim, essa rejeição não implica inelegibilidade automática. Cabe à Justiça Eleitoral decidir, caso a caso, se o gestor se tornará inelegível com base na rejeição das contas.
Por outro lado, a responsabilização por danos ao erário, decorrente de atos de gestão, continua sendo de competência exclusiva dos Tribunais de Contas. Isso significa que a imposição de sanções financeiras, como a devolução de valores ou aplicação de multa, independe da manifestação da Câmara Municipal e não possui efeitos diretos no campo eleitoral.
Contexto da decisão
Em 2016, o STF já havia decidido, em tema de repercussão geral, que os Tribunais de Contas deveriam emitir pareceres prévios sobre as contas dos prefeitos, sendo o julgamento final de competência das Câmaras Municipais. Com base nessa decisão, diversos Tribunais de Justiça passaram a anular sanções impostas pelos Tribunais de Contas a prefeitos, incluindo imputações de débito e multas, sob o argumento de que somente os Legislativos locais poderiam julgá-los.
A Atricon considerou que essa interpretação era equivocada, pois o julgamento do STF de 2016 tratava apenas das contas de governo e de seus efeitos eleitorais, e não das contas de gestão. Na prática, o entendimento equivocado enfraquecia a atuação dos Tribunais de Contas e permitia que prefeitos com apoio político local escapassem de responsabilização técnica por irregularidades na administração dos recursos públicos.
Diante disso, a Atricon ajuizou a ADPF 982, julgada de forma unânime pelo plenário do STF em fevereiro de 2025. O acórdão foi publicado em março.
Com a nova decisão, o Supremo corrige o entendimento anterior e deixa claro que os Tribunais de Contas têm autonomia para julgar contas de gestão de prefeitos que atuam como ordenadores de despesas, aplicar sanções e exigir ressarcimento ao erário, sem necessidade de submissão ou ratificação pela Câmara Municipal.
Leia a íntegra do Acórdão do STF, publicado em março:
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