Justiça

Falhas na proteção: juiz condena Estado e Município a pagar R$ 430 mil aos pais de Sophia

Marcelo Andrade Campos Silva reconheceu a omissão dos entes públicos em um verdadeiro "jogo de empurra-empurra", enquanto deveriam garantir a proteção da infante

8 OUT 2025 • POR Vinícius Santos • 17h12
Sophia de Jesus Ocampo morreu e caso ainda segue sem respostas - Arquivo Pessoal/Reprodução/Redes Sociais

A Justiça da Capital condenou o Estado e o Município de Campo Grande a indenizarem Jean Carlos Ocampo da Rosa e Igor de Andrade Silva Trindade, pai biológico e pai afetivo de Sophia de Jesus Ocampo, vítima de um crime que chocou o Brasil em 2023. 

A menina, que tinha apenas 2 anos e 7 meses, morreu em decorrência de agressões perpetradas pelo padrasto, Christian Campoçano Leitheim, que mantinha relacionamento com a mãe da criança, Stephanie de Jesus da Silva. A sentença fixou o valor total de indenização por danos morais em R$ 430.000,00 (quatrocentos e trinta mil reais).

A decisão é do juiz Marcelo Andrade Campos Silva, da 4ª Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos da Capital, e reconheceu falhas e omissões sucessivas dos agentes públicos municipais e estaduais na proteção da vida da infante Sophia. O magistrado destacou que houve um verdadeiro “jogo de empurra-empurra” entre os entes públicos, resultando na ausência de assistência efetiva à criança.

Segundo a ação judicial, Jean buscou, de forma constante e reiterada, entre dezembro de 2021 e 26 de janeiro de 2023, a proteção de órgãos públicos como o Conselho Tutelar e a Delegacia de Polícia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DEPCA), enfrentando repetidamente a inércia dos agentes públicos. 

Os requerentes relataram que passaram um ano sendo “jogados de um órgão público para outro”, sem qualquer medida protetiva, enquanto a criança era torturada e estuprada pelos agressores.

Indícios ignorados

Apesar de registros de ocorrências, imagens da criança com hematomas, gravação de conversa com a avó materna alertando sobre os maus-tratos e evidências de um ambiente insalubre, nenhuma providência eficaz foi tomada para proteger a menina.

Falha no atendimento médico

Mesmo após ser levada a Unidades de Pronto Atendimento vinculadas ao Município com hematomas e fratura na perna (tíbia), os prontuários médicos não registraram indícios de violência, atribuindo os ferimentos apenas a quedas.

Danos morais, materiais e homofobia sistêmica

Os pais alegaram que o descaso das autoridades e a perda da filha lhes causaram danos morais e, por se tratar de família de baixa renda, também danos materiais, pleiteando pensão vitalícia. Eles também sustentaram ocorrência de homofobia sistêmica velada, argumentando que as denúncias feitas por um casal homoafetivo não eram tratadas com interesse preventivo pelos órgãos públicos.

No entanto, ao proferir a sentença, o juiz não menciona explicitamente o reconhecimento da "homofobia sistêmica velada" como fundamento para a condenação.

Resumo da condenação

A Justiça considerou parcialmente procedentes as alegações dos requerentes e condenou o Estado de Mato Grosso do Sul e o Município de Campo Grande ao pagamento de indenização por danos morais: R$ 350.000,00 para Jean e R$ 80.000,00 para Igor, além de pensão vitalícia por danos materiais.

O juiz destacou que houve “seguidas e sucessivas falhas e omissões dos agentes públicos municipais e estaduais, durante e após os atendimentos das ocorrências envolvendo a infante Sophia”, configurando responsabilidade civil objetiva com base na teoria do risco administrativo. A decisão ressaltou que se tratou de uma omissão específica, pois o Estado tinha obrigação legal de evitar o dano.

O magistrado ainda destacou o dever legal do Estado, da família e da sociedade de “assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida” (art. 227 da Constituição Federal).

Pensão vitalícia

O pensionamento vitalício foi concedido devido à condição de baixa renda da família, conforme entendimento pacífico do STJ. O pagamento começará em 02/06/2034 e cessará definitivamente em 02/06/2095, sendo efetuado de forma continuada, e não em parcela única.

O Estado e o Município têm o direito de recorrer da sentença, mas a decisão já reconhece a responsabilidade pelos danos morais e materiais sofridos pelos pais da vítima.

Condenação em Tribunal do Júri

Em 5 de dezembro de 2024, Stephanie de Jesus da Silva e Christian Campoçano Leitheim foram condenados a um total de 52 anos de prisão pela morte e abuso sexual de Sophia de Jesus Ocampo, de apenas 2 anos. O julgamento, que durou dois dias, teve a sentença proferida pelo juiz Aluízio Pereira dos Santos, da 2ª Vara do Tribunal do Júri. Stephanie foi condenada a 20 anos de prisão e Christian a 32 anos.

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