Justiça

Os desencontros do MP

Dois promotores podem ter posturas totalmente diferentes num mesmo caso e tomar rumos opostos

6 ABR 2019 • POR Da redação • 08h54
Rafaela Siufi foi acusada e inocentada por improbidade administrativa pelos promotores Adriano Lobo Resende e Marcos Alex - Reprodução

Como dois promotores podem ter posturas totalmente diferentes num mesmo caso e tomar rumos opostos? O caso em questão é um prato cheio para os críticos do Ministério Público. Ele revela que é possível perder tempo custeado pelo erário público, portanto com dinheiro nosso, por falta de cuidados básicos, ou de não se ter a obrigação de tomar alguns cuidados que seriam necessários, tais como cruzar informações.

A parte, hoje talvez a vítima, é a oncologista Rafaela Moraes Siufi Silva, filha de Adalberto Siufi, envolvida em rumoroso caso no Hospital de Câncer, que foi acusada de improbidade administrativa. A “denúncia” feita contra ela partiu do ex-diretor do Hospital, Carlos Alberto Coimbra.

Ele a fez em duas frentes, no Ministério Público Estadual (MPE) e no Ministério Público Federal (MPF). No estadual, os fatos caíram nas mãos do duro promotor Marcos Alex que, após analisar a defesa da filha de Adalberto Siufi, mandou arquivar a denúncia, aceitando os argumentos da defesa.

Após isso, o MPF, que recebeu a mesma denúncia, devolveu a peça ao MPE e se declarou incompetente. O caso (pela segunda vez) chega ao MP de MS, agora nas mãos do promotor Adriano Lobo, que manda denunciar Rafaela.

Vozes do MP, ouvidas pelo JD1 Notícias, afirmaram, em “off”, que uma segunda ação só poderia ser iniciada pelo MPE com a existência de fatos novos, o que não havia, mas a peça oriunda do MPF e que originou a ação, já arquivada por outro promotor – Marcos Alex –, anteriormente, é a mesma.

O segundo promotor envolvido na questão, Adriano Lobo, e que mandou dar prosseguimento à denúncia, argumentou contra um arrazoado do advogado da Rafaela Siufi, André Xavier, afirmando que as promotorias têm autonomia entre si.

Nem o próprio MP, representado pela procuradora de segundo grau Mara Bravo, que representa o Ministério Público em julgamentos no Tribunal de Justiça, se convenceu com esses argumentos, e votou pelo fim do processo. A decisão final tem termos ácidos, grafados pelo desembargador Renato Pavan, ao se pronunciar sobre o caso.

Manifestação do desembargador Renato Pavan tem trechos incisivos – “O que se vislumbra no caso, infelizmente, é mais um daqueles casos em que o Ministério Público propõe, sem qualquer base ou fundamento legal, ação civil pública que somente vem denegrir a imagem das pessoas, não se encarregando, depois, de propor uma 'errata' para levar ao conhecimento do público que tanto a investigação quanto a ação proposta foram – este, sim – atos que devem merecer o repúdio de cidadãos de bem, como a agravante, que a qualquer momento pode ser investigado sem saber que o é e, pior, posteriormente acusado de um ato desonesto, ilegal, que cometeu”.

Entenda o caso

Conforme relato da defesa, Rafaela era concursada da Prefeitura de Campo Grande e trabalhava 20h/semanais.  Ela também atuava no Hospital de Câncer em dias não coincidentes com o trabalho na prefeitura.

O lugar onde Rafaela trabalhava passou por reformas neste período e a mesma ficou sem local para exercer suas funções e assim recebia salário sem produzir. De modo que a acusada, segundo o Ministério Público, foi transferida para o Hospital de Câncer para, além dos atendimentos que já fazia, atender também às segundas-feiras, dias que não coincidiam com o atendimento no município.

Nas terças e quintas-feiras, ela desempenhava o restante da carga horária do município dando aulas aos residentes de pediatria da Santa Casa local, por causa de convênio firmado com a prefeitura. Desse modo, as 20h/semanais que ela deveria cumprir no local que havia sido fechado para reforma foram remanejadas.

Assim, o administrador do Hospital de Câncer fez duas denúncias contra Rafaela no Ministério Público Estadual e outra no Ministério Público Federal. Em sua denúncia, o mesmo alegou que ela estaria recebendo do município para fazer o trabalho para o qual o hospital já a pagava, fato desmentido pela defesa.