Justiça

Vídeo - Recruta denuncia tortura em quartel da capital

Sargento da 9 ª Companhia de Guardas do CMO, queimou o pescoço do soldado, após jogar álcool e acender um isqueiro próximo a ele

28 ABR 2020 • POR Sarah Chaves • 16h39
O jovem de 18 anos teve seu pescoço, nuca e parte das orelhas queimadas - Reprodução

Um soldado do Exército Brasileiro, de 18 anos, acusa um terceiro sargento da 9 ª Companhia de Guardas do Comando Militar do Oeste (CMO) de tortura dentro da unidade militar. Ele entrou com uma ação contra seus superiores.

De acordo com relatos a vítima que terá a identidade preservada, o sargento teria ateado fogo em seu corpo na presença de dois soldados do efetivo profissional, que não teriam feito nada para impedir. A vítima compõe o quadro de efetivo variável, conhecido como recruta.

O recruta conta que por volta de 16h40 da tarde do dia 23 de março, realizava manutenção das áreas de faxina do pelotão, junto com outro recruta, quando um dos soldados o chamou pejorativamente de Greg (personagem da série Todo Mundo Odeia o Cris) e pediu para que ele buscasse um isqueiro.

Então, a vítima saiu em busca de um isqueiro. “Pedi o isqueiro a um soldado, que falou que não tinha, nesse momento o sargento vinha em minha direção. Pedi permissão ao sargento para falar com ele e pedi o isqueiro emprestado, ele falou que não tinha e já pediu para eu ir para dentro do pelotão, e me levou até lá”, relata.

Ao entrar no pelotão, o recruta afirma que o sargento pediu que ele ficasse em posição de flexão, que ele iria "pisar em sua cabeça", e após o graduado, insistir, a vítima ficou na posição. “Ele falou algo e jogou um líquido gelado na minha nuca, que parecia o spray de jato do álcool em gel, e perguntou para os soldados, que estavam lá dentro, se caso ele acendesse o isqueiro se poderia pegar fogo. Em seguida ele já acendeu e eu comecei a pegar fogo, foi quando ele se assustou e tentou apagar o fogo do meu pescoço”, relata.

Depois que conseguiu apagar o fogo, a vítima continuou na sala do pelotão onde um dos soldado pediu para que ele não contasse nada, pois daria muito problema para o sargento. 

Ao subir para seu quarto, ele recebeu ajuda de outro soldado que ligou para o pai perguntando quais remédios eram indicados para queimaduras, e em nenhum momento os responsáveis pelo dano foram solícitos em levá-lo a enfermaria do local, pelo contrário, segundo o soldado, ao ficar sozinho no quarto com o sargento e outro soldado, os militares começaram a pensar em desculpas que o recruta poderia dar para as marcas em seu pescoço “O sargento e soldado falaram de queimadura solar, alergia a remédio de espinha, e reação a protetor solar misturado com álcool em gel”, relatou a vítima.

O recruta conta que foi chantageado pelo soldado que afirmou que se o recruta não contasse o ocorrido, poderia ter alguns privilégios lá dentro, como alívio no campo e poucas guardas e plantões.

O soldado relatou ainda que informou os fatos a outros sargentos e tenentes, mas ninguém o ouviu formalmente, apenas quando um grupo de sargentos de dia o ouviu, um deles, o levou ao médico que registrou queimadura de primeiro grau com pontos de segundo grau, auxiliando a vítima a fazer curativos, duas vezes ao dia durante dez dias.

Processo

Os advogados de defesa da vítima, Dr. Pablo Arthur Buarque Gusmão e Dr. Renato Cavalcante Franco, diligenciaram juntos a um oficial da 9ª Companhia de Guardas, a instauração do inquérito penal militar, pois o crime ocorreu dentro do aquartelamento.

Ao JD1 Notícias, o advogado Pablo Gusmão, informa que no dia 3 de abril houve a inquirição do ofendido, que levou mais de 3 horas, para ouvir todos os encarregados e testemunhas. “É um absurdo que em pleno ano 2020 existam situações de trotes extremos nos quartéis. Estamos acompanhando o Inquérito Penal Militar, com afinco, todos os responsáveis direta ou indiretamente por este ato extremo serão responsabilizados. O soldado está muito abalado emocionalmente com a situação e está fazendo acompanhamento psicológico, mormente tinha o sonho de servir o exército brasileiro, assim como seu irmão que é soldado do efetivo profissional em outra organização militar”.

Os soldados que presenciaram o fato e permaneceram inertes,  vão responder por omissão, pois de acordo com a defesa da vítima, tinham obrigação de interferir ou impedir o sargento de cometer o fato, e não fizeram, apenas observaram.

No âmbito cível, os advogados estão providenciando uma ação contra a união, pelos danos morais, danos materiais emergentes, e danos estéticos. “Tendo em vista os gastos que ele está suportando e pelos danos estéticos, para tentar futuramente amenizar as sequelas das queimaduras”, afirmou Pablo Gusmão.

O inquérito policial militar nos termos do CPPM e poderá leva até 40 dias para sua conclusão. Em seguida, a conclusão do Inquérito será encaminhada ao Ministério Publico Militar Federal “No inquérito penal militar a investigação vai prosseguir, posteriormente vai  ser oferecida a denuncia e o sargento e os dois soldados responderão  pelos delitos que o promotor de justiça achar pertinente. Ao nosso ver pode ser lesão corporal, do grave, lesão corporal média ou leve, podendo ser enquadrado como uma modalidade de tortura castigo que é previsto em legislação especial e perfeitamente aplicável ao militar”, explicou o advogado Renato Franco.

“E agora recebemos uma intimação para comparecer no dia 5 de maio as 8h30 da manha na 9ª Companhia de Guarda para reprodução simulada dos fatos”, finalizou a defesa da vítima.

O JD1 Notícias entrou em contato com a assessoria do CMO para obter o posicionamento diante deste caso, mas até o fechamento desta reportagem não obteve resposta.