Justiça

Por "má-fé", Ministério Público é condenado em São Paulo

Ainda cabe recurso da sentença

14 JAN 2022 • POR Méri Oliveira, com Folha de S. Paulo • 18h43
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A Justiça de São Paulo condenou o Ministério Público por má-fé por ter proposto, supostamente sem provas, uma ação de improbidade administrativa contra funcionários do Hospital das Clínicas, sob a acusação de terem feito compra superfaturada de insumos hospitalares.

Ao condenar a Promotoria por litigância de má-fé, o magistrado determinou o ressarcimento "dos honorários sucumbenciais" em R$ 10 mil, a cada um dos réus, que funciona como uma espécie de indenização às pessoas (físicas e jurídicas), já que o dinheiro vai para os réus, e não para os advogados.

Esses valores serão pagos pelos cofres públicos, do contribuinte paulista, caso a decisão seja mantida pelos tribunais. Como se trata de sentença de primeira instância, ainda cabe recurso. Procurado, o Ministério Público informou ter recorrido da decisão (leia abaixo).

Em sua sentença, o juiz da 3ª Vara da Fazenda Pública, Luis Manuel Fonseca Pires, afirma que a Promotoria, para apontar o ato improbo, limitou-se a comparar preços de compras feitas em 2019 e 2020, mas não considerou os aumentos de um ano para o outro em razão da pandemia da Covid-19.

A Promotoria também teria ignorado os alertas de regularidade dos contratos.

"O Ministério Público não pode eleger uma ficção (ignorar a pandemia) e acusar por improbidade todos aqueles que não se encaixam neste seu universo paralelo. Por ter agido assim, é preciso reconhecer que houve má-fé processual", diz trecho da sentença publicada no final de 2021.

A ação refutada pela Justiça de primeira instância foi movida pelo promotor Ricardo Manuel Castro, da Promotoria do Patrimônio Público, em maio de 2021. Em resumo, ele acusou o HC, os funcionários e uma empresa (Air Liquide Brasil), de terem participado de uma compra superfaturada.

De acordo com a ação da Promotoria, a cúpula do HC firmou um contrato emergencial para aquisição de mistura medicinal de óxido nítrico balanceado com nitrogênio em 2020, por R$ 580,00 por metro cúbico, sendo que ela mesma havia firmado o mesmo objeto ao preço de R$ 188,67 por metro cúbico, em abril de 2019.

Para o Ministério Público, essa compra gerou um prejuízo aos cofres públicos acima de R$ 1,3 milhão. De acordo com o magistrado, porém, em nenhum momento o promotor fez uma ponderação entre os dois períodos dos contratos, um deles antes e outro em plena pandemia.

Até porque o produto adquirido pelo HC foi utilizado para o tratamento de insuficiência respiratória de pacientes vítimas do coronavírus.

Recurso

Por meio de nota, o Ministério Público informou que entrou com recurso contra a decisão, assinado pelo promotor André Pascoal da Silva. Nele, a Promotoria pede que o pedido seja procedente contra os réus e, por outro lado, seja afastada "a condenação do Ministério Público a litigância de má-fé e ao pagamento de custas processuais".

Entre os motivos sustentados pelo promotor é que a ação foi proposta com base nos elementos "colhidos durante a instrução do inquérito civil", que ajudaram a formar a convicção do membro do Ministério Público sobre necessidade de propositura de ação de improbidade administrativa, "tendo atuado, portanto, no exercício de sua função institucional".

"A litigância de má-fé é o exercício de forma abusiva de direitos processuais, percebe-se, assim, que não basta ter ocorrido algum dos itens descritos no art. 80. É essencial que aquele ato processual tenha sido praticado com intenção de gerar qualquer tipo de prejuízo à outra parte", diz trecho do recurso.