Vivemos em uma era de extraordinários avanços tecnológicos no campo. O agro brasileiro se consolidou como um dos mais modernos e competitivos do mundo, impulsionado por soluções que derivam diretamente da ciência e da tecnologia. Drones monitorando lavouras, sensores de umidade integrados, microchips que contam a história e origem de um animal, colheitadeiras inteligentes com direção balizada por GPS e cabines climatizadas. Tudo isso é motivo de orgulho para o Brasil e especialmente para estados como o Mato Grosso do Sul, que figuram na vanguarda da produção.
No entanto, é justamente neste cenário que se instala uma grave contradição. O Projeto de Lei 2.159/2021, denominado Lei Geral do Licenciamento Ambiental (LGLA), mas já conhecido como o "PL da Devastação", avança no Congresso sob a falsa promessa de simplificar processos. Aprovado no Senado em maio de 2025, agora segue para reanálise na Câmara dos Deputados. Sua essência, porém, é o enfraquecimento dos principais instrumentos de controle e prevenção ambiental em nome de uma suposta celeridade.
Não se trata de um debate entre produzir ou preservar. Trata-se de garantir que a produção continue sendo possível. As condições climáticas que viabilizam o agronegócio dependem de ecossistemas saudáveis e funcionais. Sem chuva, sem solo protegido, sem estabilidade climática, não há tecnologia que sustente a produtividade. A erosão da governança ambiental como aquela permitida pelo PL pode nos levar a uma terra exaurida, à escassez hídrica e a um aumento de conflitos no campo.
"Não há coerência em assumir compromissos climáticos globais enquanto, internamente, enfraquece-se a governança ambiental, favorecendo a poluição, a destruição de vegetação nativa florestal e não florestal , a grilagem de terras, a violência no campo, a impunidade e o retrocesso institucional. Essa contradição compromete a segurança jurídica e ambiental necessária para operações baseadas em ativos da natureza, impõe riscos significativos às cadeias de suprimentos e desestimula a criação de valor sustentável em longo prazo."
"Este cenário de caos nos fará retardatários na questão ambiental em que somos protagonistas e trará consequências graves para a biodiversidade, para os povos tradicionais e para a credibilidade do Brasil no cenário econômico e ambiental internacional."
Trechos do POLICY BRIEF PARA TOMADORES DE DECISÃO, PRODUZIDO PELO CENTRO DE CONHECIMENTO EM BIODIVERSIDADE (INCT/CNPQ/MCTI)
Knowledge Center for Biodiversity, Belo Horizonte, MG, Brazil. Copyright 2025
Para mais informações, acesse: https://www.biodiv.com.br/
É preciso destacar a incoerência: avançamos em tecnologia quando ela é conveniente e melhora a produtividade. Contudo, segmentos sociais mais imediatistas, negam a mesma ciência quando ela alerta para os limites do planeta. A mesma senadora de nosso Estado que defende o agronegócio tecnificado é também uma das vozes que impulsionam o PL da Devastação. É como celebrar o progresso ao mesmo tempo em que se mina a base que o sustenta.
No momento em que o Brasil se prepara para sediar a COP 30, na Amazônia, o mundo estará olhando para nosso compromisso com o futuro. Sediar uma conferência global sobre clima e biodiversidade enquanto se desmonta o licenciamento ambiental é uma contradição que enfraquece nossa credibilidade, afasta investimentos e fecha mercados no exterior.
A ciência é, sim, o motor da prosperidade. Mas ela exige coerência. Que possamos ouvir seus alertas com o mesmo entusiasmo com que celebramos suas inovações. O futuro do campo, da economia e do Brasil depende disso.
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