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Prende pra ouvir?

17 setembro 2018 - 08h58Tiago Bana Franco

Há no ordenamento jurídico brasileiro algumas leis que, ao cair nos Tribunais, ganham curiosa interpretação. Uma delas é a Lei 7.960/89, por meio da qual é regulada a prisão temporária. Serve para alguns poucos casos, graves e muito específicos, quando a prisão do investigado se faz necessária para acautelar a investigação. Ou seja: quando o investigado está atrapalhando a investigação, o Poder Judiciário pode prendê-lo por cinco dias, prisão que pode ser prorrogada por mais cinco dias.

Já foi moda, mas parece que agora estão de volta à ribalta, prisões temporárias determinadas com o objetivo exclusivo de ouvir o investigado.

Não é preciso dizer que se trata de uma interpretação canhestra da lei, pois em momento algum ela permite que o investigado seja preso para que a Polícia o ouça, para que seu depoimento venha a ser colhido. Mesmo porque o investigado tem o direito sacrossanto de ficar em silêncio (art. 5º, inc. LXIII, da Constituição Federal). Prender para obrigá-lo a depor é uma afronta à Constituição, pois ele constitucionalmente não precisa dizer nada! Fala se quiser, quando quiser e o que quiser.

E é uma afronta ainda que o investigado não colabore com a investigação?

Sim!

Uma coisa é o investigado atrapalhar o curso da investigação; outra, bem diferente, é não colaborar com ela. Se o investigado tem o dever de não atrapalhar, como de fato tem, não tem a obrigação de ajudar.

Essa é a regra de qualquer país civilizado; mas parece que não vem sendo aceita pelos Tribunais das terras tupiniquins.

Recentemente, várias personalidades de Mato Grosso do Sul tiveram sua credibilidade abalada ao serem presas temporariamente para que a Polícia Federal simplesmente colhesse seus depoimentos.

Felizmente, no entanto, o evidente erro judiciário perdurou por cinco dias. Prazo curto para quem está solto, mas grande demais para quem se encontra injustamente preso!

De fato, todas as pessoas presas temporariamente foram soltas depois de ouvidas pela Polícia Federal.

O curioso é que nenhuma delas havia se recusado a depor antes que a prisão fosse decretada. Muitas inclusive se colocaram à disposição da Polícia Federal. E uma especificamente havia prestado depoimento em Brasília, ocasião em que esclarecera todos os fatos relacionados à investigação contra si perpetrada.

Para que prender alguém que, além de não atrapalhar, ainda colabora com a investigação?

Eis a pergunta que haveria de ter sido respondida antes que se decretassem as prisões de pessoas que são investigadas, mas que jamais prejudicaram o curso natural da investigação, chegando mesmo a colocar-se à disposição da Polícia Federal para esclarecer o que haveria de ser aclarado.

Diante disso, só resta perguntar: quem restaurará a honra das pessoas desnecessarimente presas em mais uma operação com ares circenses?

Talvez seja o momento de pensar com mais seriedade no Projeto de Lei que visa a acabar com os desmandos de algumas autoridades.

(*) Tiago Bana Franco, advogado.

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