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Entrevista A

'A criminalidade está tomando conta do Brasil', diz o juiz Odilon de Oliveira

01 agosto 2011 - 15h53Divulgação

Há 38 anos, vivendo em Mato Grosso do Sul, o juiz federal Odilon de Oliveira atua como magistrado há 25 anos, e revela que nunca aceitou promoção. Ele afirma que gosta de atuar na linha de frente e relata que não edificou qualquer obstáculo que o impedisse a ascensão funcional. A sua marcante rigidez no combate ao crime organizado logicamente desperta tentativas de ferimento moral por parte de quem se julga atingido pelo cumprimento do dever de coibir a criminalidade. Mas, ele menciona que mesmo assim sempre empenhou com a própria vida e liberdade, o rigor da lei para que as pessoas desfrutem do privilégio de uma vida serena. Veja a entrevista na íntegra:

Jornal de Domingo - O PCC e as quadrilhas que agem a partir de presídios não mereceriam uma ação mais dura?

Odilon de Oliveira - Não só o PCC ou o Comando Vermelho ou qualquer outra facção. A criminalidade organizada merece um tratamento extremamente rigoroso. No entanto, como costume dizer, a legislação penal brasileira é uma mãe chorosa. A norma que pune o grande traficante é a mesma para o pequeno. Assim ocorre em relação a qualquer crime de natureza econômica. Na sonegação fiscal, sonegar pouco ou muito gera a mesma pena. Traficar um quilo ou uma tonelada também dá no mesmo. A diferença a ser aplicada, a maior, é insignificante. Deveria haver uma gradação de acordo com a quantidade e o tipo da droga. A criminalidade está tomando conta do Brasil exatamente por causa do enfrentamento. Este deve ocorrer primeiro, mediante prevenção, o que não existe, no Brasil. As polícias não possuem estrutura adequada. O Judiciário não anda. As prisões não recuperam e, pelo contrário, servem de escritório do crime. Assim, a coisa irá de mal a pior.

Jornal de Domingo - Há sinais claros de aumento da atividade criminal em Campo Grande, o que é falta do poder público?

Odilon de Oliveira - A criminalidade tem aumentado no Brasil inteiro. Entre 2000 e 2010, a criminalidade cresceu 112%, enquanto a população brasileira teve um aumento de apenas 12%. Dez anos atrás, um preso correspondia a 730 habitantes. Em 2010, a proporção passou de 1 para apenas 388. O acentuado crescimento em Mato Grosso do Sul guarda estreita relação com sua situação geográfica. O fato de ter limites com dois países produtores de muita droga deixa este Estado em situação vulnerável. Ocupa a quinta posição em quantidade de presos por droga e a vigésima primeira quanto ao número de habitantes, em relação aos demais Estados. Sua posição é a décima segunda quanto aos crimes em geral. É uma desproporção muito grande. Tem a segunda maior população carcerária de estrangeiros cerca de 243 presos, perdendo apenas para o Estado de São Paulo.

As autoridades de Mato Grosso do Sul fazem o que podem. Em matéria de combate à criminalidade, nosso Estado faz para si e para muitos outros. É por aqui que passa grande parte da droga e das armas provenientes do Paraguai e da Bolívia. Uma boa parte desses produtos é retida pela polícia de Mato Grosso do Sul, beneficiando diretamente os Estados que seriam os destinatários. Por conta disto, o governo federal deveria dispensar atenção redobrada a este Estado, marcando maior presença nas fronteiras.

Jornal de Domingo - O senhor enfrenta uma contenda jurídica com agentes penitenciários. Isso prejudica uma possível ascensão sua no judiciário?

Odilon de Oliveira - Não há contenda entre mim e esses servidores. O problema deles é com o Ministério da Justiça, que os demitiu, e com a justiça penal, pelas vingativas e irresponsáveis ofensas proferidas contra juízes e outras autoridades. Há 38 anos, vivo em Mato Grosso do Sul, que me hospeda como cidadão sul-matogrossense. Como juiz federal há 25 anos, nunca aceitei promoção. Gosto de atuar na linha de frente. Nunca edifiquei qualquer obstáculo que me impedisse ascensão funcional. Minha marcante atuação no combate ao crime organizado logicamente desperta vãs tentativas de ferimento moral por parte de quem se julga atingido pelo cumprimento de meu dever. Sempre empenhei minha vida e minha liberdade para que as pessoas pudessem e possam desfrutar desses privilégios.

Jornal de Domingo - Em Ponta Porã após sua atuação contundente, houve uma mudança completa no perfil da contravenção e no crime e grupos de fora imperam na fronteira. Não foi pior?

Odilon de Oliveira - Durante o tempo em que passei em Ponta Porã, procurei realizar um trabalho conjunto com autoridades paraguaias. Foram muitas reuniões lá e cá. Isto possibilitou também a extradição de mais de uma dúzia de grandes traficantes brasileiros radicados no país vizinho. Atuei com bastante rigor, de modo que a criminalidade, principalmente a traficância, sentiu profundamente a presença da justiça federal. Muita coisa mudou naquela fronteira, onde muitas pessoas se julgavam acima da lei. No Paraguai, sempre existiram criminosos do Brasil, incluindo meliantes do PCC e do Comando Vermelho. Fiz o que pude.

Jornal de Domingo - Como o senhor vê as novas possibilidades de penas alternativas recém em vigor?

Odilon de Oliveira - Para mim, as desvantagens superam as vantagens. Aliás, a legislação brasileira vem se tornando cada vez mais fraca e mais desbotada pela interpretação permissiva dos Tribunais. Um exemplo disto está na lei de tráfico (11.343/06). Ela concede redução de pena de até dois terços para traficante primário, de bons antecedentes e que não integre organização criminosa. Isto permite uma diminuição para até um ano e oito meses de prisão. Do início de sua vigência até o final de 2010, o tráfico, no Brasil, cresceu 134% e a população apenas 2%.

O Supremo Tribunal Federal entende que, nessas condições, o juiz deve substituir a pena de prisão por duas restritivas de direito, normalmente prestação de serviços à comunidade e permanência, por cinco horas, aos sábados e domingos, numa delegacia de polícia ou repartição congênere, por período igual ao da pena aplicada. Isto, além de fazer mal à sociedade, pode até criar uma situação embaraçosa. Suponha-se que o filho do policial que o prendeu estude na mesma escola pública onde o traficante irá prestar serviços. A situação é constrangedora. Aliás, o só fato de um traficante prestar serviços onde crianças estudam já é uma situação maléfica.

Especificamente com relação às recentes alterações do Código de Processo Penal, penso que a maior parte das medidas cautelares destinadas à substituição de prisão beneficia a criminalidade. Muitas delas são de difícil fiscalização e o criminoso poderá praticar delitos. O recolhimento domiciliar, por exemplo, é uma delas. Determinados tipos de crime podem ser praticados de dentro de casa, através de telefone ou pela internet ou mediante interposta pessoa. Algumas dessas medidas são inteiramente sem sentido, não servindo de freio para a prática de novos delitos. Uma das poucas vantagens para a sociedade está no valor da fiança, que foi aumentado.

Jornal de Domingo - Juiz Odilon as especulações de sua entrada na política tem seu consentimento?

Odilon de Oliveira - Nunca autorizei o emprego de meu nome em especulações políticas. Também não tenho nada contra, pois respeito a liberdade de expressão e o direito a informação. Sou uma pessoa pública, bastante conhecida, pelo que julgo natural o povo receber informações sobre o que o meio político pensa a meu respeito.

Jornal de Domingo - Elas não atrapalham sua carreira como magistrado federal?

Odilon de Oliveira - Não produzem qualquer efeito neste sentido. O que o juiz não pode é realizar manifestação política. Por outro lado, não tenho qualquer desejo de promoção.

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