“Me sentia um lixo”, afirmou o microempresário Elcio Milczwski, 34, em entrevista exclusiva ao UOL, em Curitiba. Ele se refere aos anos em que trabalhou na Ambev de Curitiba e era obrigado a ver garotas de programa tirarem a roupa na sua frente, a esfregar óleo bronzeador no corpo delas e a assistir a filmes pornográficos em reuniões de “motivação” da equipe de vendas da qual fazia parte.
No início deste mês, a história ganhou manchetes em todo o país quanto o TST (Tribunal Superior do Trabalho) manteve condenação do TRT do Paraná à Ambev, que determinara que a empresa deverá pagar indenização de R$ 50 mil por conta de “assédio moral decorrente de constrangimento”.
Elcio entrou na Ambev em 2001, aos 23 anos. Já era casado. Seu trabalho era percorrer mercados, bares, restaurantes e outros pontos de vendas, munido de um computador de mão, e coletar pedidos de compra. A partir de 2003, as reuniões matinais promovidas pela gerência com a equipe de vendas –realizadas, usualmente, a partir das 7h da manhã– se tornaram pouco ortodoxas.
“O gerente passou a levar garotas de programa como forma de motivar a equipe. Mas ninguém foi avisado de que isso ia acontecer, e uma vez lá dentro, não podia sair da sala. Éramos todos obrigados a passar óleo nas garotas, éramos empurrados contra elas. Quem se mostrava contrariado era alvo de zombaria. Para quem tivesse atingido a meta de vendas era prometido um vale-programa.”
“Além de homens casados, havia também funcionárias na sala”, disse o advogado André Luiz Souza Vale, que defendeu Elcio no processo. Não é seu único cliente daquela turma. Pelo mesmo motivo, Souza Vale diz que tem outras duas dezenas de ações na Justiça trabalhista. “Uma delas já rendeu, em segunda instância, uma indenização de R$ 100 mil a um ex-supervisor de vendas, mas há recurso em trâmite no TST.”
A ação
Em 2005, Elcio pediu pela primeira vez para ser demitido pela Ambev. “Como a empresa tinha uma política que limitava o número de demissões de vendedores, não era possível.” A saída era pedir demissão, mas aí a saída renderia menos.
“O jeito foi aguentar.” Elcio finalmente conseguiu que a empresa o mandasse embora em julho de 2007. “Foram dois anos pedindo para ser demitido.” Até seus últimos dias na empresa, as reuniões de motivação com garotas de programa se mantiveram, ainda que mais raras – o auge se deu entre 2003 e 2004.
“Não entrei com processo contra a Ambev por ser evangélico, como muitas reportagens chegaram a afirmar. De fato, sou evangélico, mas o que me fez ir à Justiça foi o que sofri lá dentro. Tanto que tenho colegas que não são evangélicos nem casados e também acionaram a empresa.”
“Eu e muitos outros não queríamos estar ali, mas tínhamos de ficar. Eu tenho uma família para sustentar. Era meu trabalho. Mas sempre penso que seria mais simples, e melhor, se a Ambev oferecesse prêmios em dinheiro, em vez de vales-programa, a quem atingisse metas de vendas”, disse Élcio, que há três anos toca uma casa de assados em São José dos Pinhais, na região metropolitana de Curitiba.
Outro lado
Procurada pelo UOL, a Ambev manteve o mesmo posicionamento que assumiu quando a indenização a Elcio Milczwski tornou-se pública, no início de setembro.
“Reconhecida por sua gestão, a Ambev prega o respeito e valoriza o trabalho em equipe. A companhia, que conta com mais de 30 mil funcionários no Brasil, não pratica ou tolera qualquer prática indevida com seus funcionários”, diz nota emitida pela empresa.
“Casos antigos e pontuais não refletem o dia a dia da empresa. O bom ambiente de trabalho é refletido pelos inúmeros prêmios de gestão de pessoas que a Ambev recebe a cada ano”.
A assessoria de imprensa não soube informar ao UOL, até o fechamento deste texto, se o diretor comercial e os gerentes citados por Elcio ainda trabalham na empresa, mas disse que certamente eles não estão mais na filial de Curitiba.
Via Uol
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