Mesmo com denúncias concretas, de organização criminosa internacional atuando em todo território nacional, com mais de um milhão de pessoas envolvidas, o Ministério da Justiça protelou de várias maneiras a repressão à quadrilha. E só entrou em ação para convalidar fatos consumados, quando sua atuação não significava nenhum dano adicional à quadrilha.
Os golpes de pirâmide dependem fundamentalmente do fator tempo. São modelos que têm vida curta. Quanto mais tempos permanecem operando, maior o tamanho do golpe.
Com o advento da Internet e das redes sociais, montaram-se redes de estelionatários que lograram criar sistemas eficientes de divulgação, redes criminosas que, assim que uma corrente estoura, saltam para outra corrente, e assim sucessivamente.
Desde o início o Ministro Cardozo sabia que a repressão ao golpe da pirâmide eletrônica dependia fundamentalmente do Ministério da Justiça. Mas todos os seu atos foram protelatórios, dando tempo para que a TelexFree ampliasse seus ganhos ilícitos.
Os atos protelatórios
Foi assim no começo do ano. Quando a grita dos Procons não podia ser mais ignorada, Cardozo ouviu as demandas e, em lugar de agir, encaminhou pedido à Secretaria Especial de Assuntos Econômicos do Ministério da Fazenda, para que analisasse se o modelo era de pirâmide ou não. Ora, pirâmides são auto-identificáveis. Se todo o faturamento da rede era exclusivamente decorrente do pagamento de adesões – e de nenhuma forma mais – tratava-se de pirâmide.
A decisão de Cardozo – de exigir um laudo da SEAE – deu sobrevida de meses à TelexFree. O pedido ficou parado na SEAE sem ser cobrado pelo Ministério. Só quando blogs e sites começaram a denunciar o golpe, a SEAE se manifestou com um laudo entendendo que a TelexFree era uma pirâmide.
Nem assim o Ministério da Justiça agiu. Logo depois, um juiz de primeira instância proibiu a Fazenda de divulgar o laudo em sua home e essa decisão – totalmente esdrúxula – se manteve até hoje, sem que houvesse interesse do Ministério da Justiça em derrubá-la.
Inúmeras cobranças foram feitas a Cardozo. Foi lhe informado que havia conflitos de competência entre Justiças estaduais e a Federal, entre Ministérios Públicos Estaduais e Federal; que havia remessa de ganhos para o exterior e tentáculos do golpe em vários países. A atuação do Ministério da Justiça era imprescindível. Mesmo assim, continuou inerte. E cada dia de inação a mais significava mais ganhos para a TelexFree - e mais perdas para as vítimas.
Atuando sobre o fato consumado
Na semana retrasada, uma juíza do Acre tomou a decisão de proibir novas vendas de planos da TelexFree. A empresa tentou derrubar a liminar e não conseguiu. Só depois do fato consumado, o Ministro da Justiça resolveu agir – quando sua ação não podia mudar em nada a decisão da Justiça do Acre.
Entrou com uma ação contra a TelexFree, anunciando a possibilidade de uma multa de R$ 6 milhões, irrisória que, provavelmente, corresponde a menos de um dia de faturamento da pirâmide. Sequer abriu um procedimento criminal ou colocou a Polícia Federal para investigar as ramificações da quadrilha.
Para se ter uma ideia da desproporção da multa, o Ministério Público Estadual de Acre entrou com uma ação solicitando bloqueio de R$ 6 bilhões das contas dos controladores da companhia (http://diario.tjac.jus.br/display.php?Diario=2942&Secao=374). Indago: quantas centenas de milhões a quadrilha arrecadou a mais nesse período de contemplação do Ministério da Justiça?
Trecho da ação do MP do Acre:
“1) que sejam realizadas buscas via BACENJUD de valores até R$6.000.000.000,00 (seis bilhões de reais), em contas da pessoa jurídica requerida e dos sócios Carlos Roberto Costa e Carlos Nataniel Wanzeler, com consequente bloqueio e depósito em conta judicial; 2) que seja expedido ofício ao Sr. Superintendente do Banco do Brasil no Estado do Acre, a fim de que adote imediatas providências no sentido de bloquear a conta corrente nº 00022793-5, agência 3195-X, desde que de titularidade da primeira requerida, impedindo transações de saque, transferências, dentre outras, de tudo informando ao juízo; 3) que seja expedido ofício ao Sr. Superintendente do Banco do Brasil no Estado do Acre, para que remeta ao juízo, no prazo de dois dias, extratos da conta bancária citada e de outras eventualmente mantidas pela primeira requerida junto àquela instituição financeira, referentes aos últimos trinta dias, também mencionando, quanto aos últimos cinco dias, a forma como foram realizadas as transações em valores superiores a R$10.000,00 (dez mil reais). Indefiro o pedido de envio das informações ao Ministério Público, vez que as mesmas interessam diretamente ao processo, através do qual o requerente poderá ter ciência das mesmas”.
Que a CGU (Controladoria Geral da União) e o MPF (Ministério Público Federal) cumpram seu dever de exigir explicações do Ministro José Eduardo Cardozo.
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