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OPINIÃO: Jornalista Sérgio Neves morreu na fila de transplante

Cuidado paliativo não é sobre morrer, mas de como queremos viver

06 abril 2024 - 10h12Por: Rogerio Zanetti    atualizado em 06/04/2024 às 10h15

Todo mundo viu ou leu. Em bem pouco tempo, o apresentador Fausto Silva foi agraciado por dois transplantes, o de coração e, recentemente, de rins. E claro que fui mais um a perguntar como ele conseguiu tão rapidamente, já que as notícias dão conta do tamanho das filas de espera. Li explicações aqui e ali, e salvo que a vida de Faustão importa tanto quando a de qualquer anônimo, não me convenci inteiramente, mas ignorante que sou no assunto, o assunto passou.

Na quinta-feira, 28 de março, quando os católicos celebravam o lava-pés e o fato conhecido como última ceia, faleceu em Campo Brande o jornalista Sérgio Neves, depois de uma luta de 1 ano e 3 meses de luta contra a cirrose hepática, uma doença cruel e, muitas vezes, degradante. Sérgío, homem pacato, de voz mansa e suave, bom pai e amigo, atuou muito tempo e é bem conhecido em Cuiabá, onde forjou sua carreira no jornalismo esportivo, e foi apenas mais um a morrer mantendo até o fim a esperança de uma nova chance de vida. Ele não se entregava. Durante todo o período e internação e hemodiálise com idas e vidas ao Hospital Regional num tratamento que incluía também algo extremamente invasivo denominando oaracensetese, que é a retirada da água pela barriga a cada 15 dias, só para se ter uma ideia de seu calvário. 

Tão logo os rins pararem de funcionar, passou à hemodiálise após a alta do CTI. Então, da clínica de onde fazia esse tratamento - talvez um dos mais cruéis possíveis ao ser humano, foi necessário retirar o acesso e o enviaram para a Santa Casa, de onde dizem ser mais seguro para o procedimento, já que o quadro era muito delicado. Na terça-feira anterior ao seu falecimento, aparentava estar razoavelmente bem, conversando, interagindo com todos.

O fato é que, a partir dai só se pode denominar o que houve com o Sérgio como desumano. Tentaram o acesso por dez vezes e, sem sucesso, e esperando um especialista ele ficou por toda a noite, desnudo e sangrando no corredor lotado. Ao questionamento se ele ficaria ali, daquela forma e sem medicação que surge alguma informação, mesmo que para dizer que o tal especialista só o veria no outro dia e, pasme, que a filha poderia levá-lo para casa com o compromisso de que voltasse no outro dia já que, imagine, não se tratava da alta hospitalar. E, sem alternativa, assim foi feito.

De volta no dia seguinte, novamente o sacrifício para que se encontrasse o acesso, e logo depois a hemodiálise. A seguir, Sérgio passou a noite sozinho na Ala Vermelha da Santa Casa e nem se pode pensar em quais condições, sendo transferido na manhã da quinta-feira para a Ala Verdade. Imagine a felicidade da filha, Siana, com a notícia e já na esperança de uma alta definitiva. No entanto, ela foi surpreendida ao encontrar o pai entre palidez total e vômitos de sangue sobre uma maca. Três horas depois, o Sérgio nos deixava. “Meu pai morreu cheio de esperanças, e a nossa esperança morreu com ele. Uma coisa e certa, foi melhor ele viver no paraíso do que permanecer morto aqui  na terra. Ou seja , mais um a vítima do sistema lento e burocrático da Saúde no Brasil”, lamentou a filha. E ela tem razão, A profissional médica vascular o colocou numa sala, e não um CTI, ou seja, sem os aparatos adequados em caso de emergência. Ffizeram a paracentese na mesma hora que fizeram acesso.

Tal procedimento demorou 3 horas, a sala ficou totalmente ensanguentada,  parecia um "açougue" ,e não fizeram a reposição de sangue.

A intenção da família, e desse texto, não é a busca de culpados ou a demonização do serviço público de saúde. Sabíamos que a situação de Sérgio era gravíssima. Mas, também sabemos da importância e grandeza do SUS, e de quão inglória é a missão de atender entre 120 e 150 milhões de pessoas. É apenas um alerta para que, além do atendimento profissional se busque a cada dia  mais a humanização do atendimento. Nada pode ser mais poderoso do que isso quando - como nesse caso - se busca atendimento a casos tão graves e com risco de morte. Há tempos precisamos discutir como buscar a atenção e o olhar carinhoso em hora tão difícil. Precisamos urgentemente de uma política de cuidados paliativos no SUS, isso é fato concreto.

Por isso pedimos em especial que a direção da Santa Casa tomem as medidas necessárias para que nenhum paciente seja tratado dessa forma tão desumana e sobretudo que todos tenham um olhar mais atento ao sistema de saúde do nosso país.

Descanse na luz, Sérgio Neves, e que seu sofrimento não tenha sido em vão e sirva de semente para condições melhores para todos os pacientes que clamam por socorro e atenção nesse momento.

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