Preconceito, prostituição e falta de oportunidades no mercado de trabalho são alguns dos desafios enfrentados por pessoas transgêneras, motivo pelo qual foi criado o Dia da Visibilidade Trans, comemorado nesta sexta-feira (29). O JD1 Notícias conversou com três pessoas trans, moradoras de Campo Grande, que relataram seus maiores desafios durante sua trajetória.
Maya Maldonado, 25 anos, começou a transição para se tornar uma mulher trans há dois meses e ela conta que seu maior desafio em foi enfrentar sua família. “Pra mim, encarar a minha família foi um divisor bem importante. Primeiro eu me assumi transgênera pros meus amigos, pessoas próximas que eu tenho mais convívio, chegou uma hora que pra mim já estava insuportável aquela situação, eu queria que eles soubessem sobre esse novo ser que eu me tornei. Eu sempre fui na verdade, a única diferença é que eu estava revelando aquilo naquele momento pra eles. Aproveitei que estava todo mundo reunido e ‘soltei o verbo’ sobre o que estava acontecendo”, explica.

“A parte que mais me marcou na transição foi quando eu coloquei o meu cabelo de volta e quando eu tive minha primeira TPM. Eu não sabia o que estava acontecendo, foi muito estranho, eu senti dor, meu peito inchou muito, me senti uma garota de verdade. Foi quando eu percebi que não é só a cabeça da gente, o corpo começa a responder do jeito que sempre tinha que ser”, conta Maya.
A consultora de imagem, Eloá da Silva, 29 anos, conversou com a gente sobre como foi lidar com questões como o preconceito e o mercado de trabalho.

“Quando eu comecei a fazer a transição, estava trabalhando e a empresa reduziu meu salário, igualando ao de uma mulher, mas com o mesmo cargo e mesmas funções. Além de sofrer transfobia, ainda tive que lidar com o machismo logo no começo. Hoje eu sou consultora de imagem, ajudo pessoas com escolha de roupa, maquiagem, etc., ainda assim tem mulher que se sente ameaçada por estar perto de mim no meu local de trabalho”, conta. “Eu dei uma palestra esses dias e descobri que tem uma empresa no Brasil que criou uma cota onde eles contratam apenas pessoas trans, ajudam com a transição, com apoio psicológico, a conseguir a carteira com o nome social, é de empresas assim, que abrem as portas para as pessoas que precisamos. Se essa aceitação acontece, a produtividade e a vontade de trabalhar aumentam, as empresas precisam entender isso”, explica.
Ao falar sobre o preconceito, Eloá diz que aprendeu que não é a falta de informação que faz das pessoas preconceituosas. “O preconceito não é falta de aprender sobre algo ou a falta de informação, não é algo que se aprende na religião, porque todas as religiões vão te mostrar o caminho da luz, algo bom. Temos que parar de achar que são essas coisas que fazem alguém ser preconceituoso. Ele é fruto da falta de caráter, das escolhas de cada um”, conta. “Eu sofro mais preconceito de mulher de que de homem. Se saio e conheço um casal, por exemplo, conversamos para ter uma amizade, em algum momento em que eu estiver sozinha com a mulher ela vai ter algum comentário transfóbico. Vai tentar afirmar na conversa que ela é mulher. Os homens tem seus preconceitos em formas de piadinha entre eles mesmo, porque infelizmente ainda somos muito fetichizadas. Muitos homens procuram mulheres trans para fins sexuais. Eu tento usar minhas redes sociais para ajudar pessoas que assim como eu, passam por dificuldades e preconceitos”, explica.
“Pra mim, uma das partes que mais me emociona é o fato de eu sentar na frente do espelho e poder falar comigo mesma do jeito que eu sou. Fazia isso também quando era criança, mas sofri muito preconceito dentro de casa, minha família brigava comigo por fazer isso. Então depois que eu pude me assumir, ter minha própria identidade formada, sentar na frente do espelho e poder falar comigo é algo que me emociona até hoje”, diz Eloá.
Em um vídeo publicado recentemente em sua rede social Instagram @eloadasilva, ela faz um relato sobre as suas vivencias e das pessoas transgêneras que a cercam. O vídeo foi recentemente traduzido em libras pelo Roberto Lima (@tilscoringa). Assista ao vídeo:
Autoaceitação

A maquiadora Isabella Maria de Lino, 25 anos, contou que a parte mais difícil foi passar por cima pôr da própria aceitação. “Eu sabia que seria difícil quando comecei a transição em 2018, a parte mais complicada foi a autoaceitação. As outras coisas vêm aos pouquinhos, mas me aceitar foi o mais complicado”, conta. “Não passei por dificuldades sobre a questão do mercado de trabalho, aos olhos da sociedade eu sou visualmente aceitável. Não sei se sou privilegiada por isso. As pessoas buscam o comum, talvez o fato de eu ser comum faz de mim uma pessoa privilegiada”, explica.
Sobre o preconceito, Isabella conta que tenta ignorar, porque ela se aceita como é. “Essa questão do preconceito é algo que não as pessoas escolhem ter. Eu enfrento isso aceitando quem eu sou, sabendo do meu caráter e ideais. Se as pessoas tem algum preconceito com isso, elas têm que procurar se informar e aceitar que ninguém precisa se encaixar no que elas querem”, diz Isabella.
Dia da Visibilidade Trans
O Dia da Visibilidade Trans foi criado em 2004, quando 27 pessoas trans foram ao Congresso Nacional, em Brasília, em uma campanha elaborada por lideranças do Movimento de Pessoas Trans, em parceria com o Programa Nacional de DST/Aids do Ministério da Saúde.
Ainda na data de hoje, a Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus) lançou o site Cidadania Trans, um guia prático sobre como dar entrada na retificação de prenome e gênero. A ação vai ganhar ainda mais relevância com a sanção da nova lei que vai permitir o uso do nome social também na lápide e na certidão de óbito da pessoa trans.
Orientação
De acordo com a Sejus, o guia será hospedado dentro do site da pasta, e vai ampliar o direito das pessoas trans a retificarem seu prenome e gênero nos cartórios brasileiros sem a necessidade de um processo judicial, como era feito no passado.
Assim, o site com o Guia Prático para Retificação de Prenome e Gênero de Pessoas Trans do Distrito Federal vai orientar e auxiliar, de maneira menos burocrática, com linguagem simples e acessível, quem deseja requisitar o direito ao uso do nome social.
Pacto
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a expectativa de vida das pessoas trans no Brasil é de 35 anos. Em 2019, o Governo do Distrito Federal, por meio da Sejus, assinou o Pacto de Enfrentamento à Violência LGBTfóbica que, juntamente com o Governo Federal e os estados, têm buscado ações de combate ao preconceito e a violência contra a população LGBT.
Denúncias por LGBTfobia
Em caso de agressão por motivação LGBTfóbica, a Sejus orienta a população que a denúncia seja feita de forma presencial na Decrin, no telefone 197 ou na delegacia eletrônica. Em casos de violação de direitos humanos, a vítima deve ligar para o telefone 162 ou acessar o site da Ouvidoria.
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29 de janeiro: Mulheres trans falam sobre visibilidade e resistência (Reprodução)



